OTHER: Love Ya, by Anny

Love Ya

"Bati na porta e puxei a maçaneta com toda a força que meu corpo conseguiu reunir, mas era em vão. Eu estava presa em algum lugar e não fazia a ideia de onde era... Eu nem ao menos fazia ideia de como fora parar ali."
Gênero: Romance, Drama
Dimensão: Shortfic
Classificação: PG-13

Beta: Nikki, KImN, & Lyssa

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# Capítulo 1 # Capítulo 2 # Capítulo 3 # Capítulo 4 # Capítulo 5 # Capítulo 6 # Capítulo 7 # Capítulo 8 # Epílogo #

 

 

CAPÍTULO 1


Eu abri os olhos. Um fio de luz parecia perfurar o minha retina, fazendo-a doer com a claridade. Movimentei a cabeça a procura da direção em que o sol entrava e achei uma pequena abertura retangular em uma parede ao meu lado. Havia uma pequena cômoda mais abaixo, não era velha, mas tinha o aspecto de algo que não era usado há algum tempo. Forcei meu corpo para cima, eu deveria me levantar daquela cama desconhecida. Minha cabeça rodou. Como eu fora parar ali? Eu poderia me recuperar da tontura e simplesmente ir até uma janela a procura de ajuda. Passei os olhos por toda a extensão do quarto e não encontrei mais nada. Uma cama. Uma cômoda. Uma pequena abertura para o ar passar, sendo esta tão alta que eu mal conseguiria enxergar mesmo subindo no objeto abaixo. Uma porta a minha frente. Ordenei meus pensamentos e forcei meu corpo novamente, dessa vez tendo um resultado melhor. Em passos cambaleantes eu cheguei até a porta. Passei as mãos pela maçaneta e a girei, mas estava trancada. Eu girei mais uma vez e nada. Outra. Mais outra. O desespero começou a tomar conta de mim e um nó crescia em minha garganta, uma mistura no desejo de chorar e gritar. Bati na porta e puxei a maçaneta com toda a força que meu corpo conseguiu reunir, mas era em vão. Eu estava presa em algum lugar e não fazia a ideia de onde era... Eu nem ao menos fazia ideia de como fora parar ali.

.X.

Empolgada demais. Com medo demais. Todos esses sentimentos que se tem quando se chega a um novo país. Procurei um telefone público o mais rápido possível e disquei os números com cautela. Demorou alguns segundos para que a ligação fosse completada. Aquela voz me fez sorrir, a voz de quem sempre me incentivara e acreditara em mim. Minha mãe. Depois de alguns comentários com os típicos “Cuidado, juízo e boa sorte” eu desliguei o telefone e respirei fundo. Agora a minha vida na Coréia do Sul começaria. O Brasil estava temporariamente para trás.

A vida em um novo país não era algo maravilhoso. Eu tinha que me esforçar para manter minhas notas boas e ainda havia conseguido uma permissão de trabalho durante meio período para conseguir desfrutar melhor da minha viagem ao país, embora o tempo para isso fosse curto e raramente acontecesse. Eu não reclamava, era um sonho realizado somente estar aqui, e se eu conseguisse me formar eu poderia tentar um emprego e então quem sabe ter uma vida longa e estável ali.

Não sei ao certo como o conheci, acho que foi depois que o restaurante de aveias onde eu trabalhava me pediu para fazer uma entrega. Eu simplesmente ignorei o fato de não conhecer o lugar e peguei uma bicicleta que me fora emprestada. Eu estava parando várias vezes em busca de informações e estava com medo de que o pedido esfriasse e acabasse tendo meu salário descontado por isso... A pressa deveria ter sido bastante para eu praticamente atropelar um garoto que passava pela rua. Felizmente ele foi educado demais para não me xingar e, ao contrário do que eu imaginava, ele até veio verificar como eu estava, embora nem mesmo tivesse caído. Um susto, apenas isso.

Depois desse dia, eu acho que ele andou pesquisando por onde a “doida da bicicleta” havia se escondido e quando ele me achou foi no mínimo constrangedor.

Não demorou muito para ficarmos mais próximos, mas o que me intrigava era a diferença no status social. , que agora era meu namorado vinha de uma família influente e rica do país e era o tipo de garoto que tirava suspiro de qualquer menina. Eu? Uma estrangeira que tinha que focar na escola e trabalhar para conseguir uma vida melhor em um país que eu nem podia chamar de meu. Isso o deixava levemente zangado. “Logo iremos nos casar e então esse país também vai ser seu”, ele dizia tentando me fazer esquecer todas aquelas bobeiras que enchiam a minha cabeça.

— E desde quando você é o dono do país? — Eu perguntava de forma irônica.

— Eu posso comprar ele pra você, é só me pedir! — Ele brincava, sabendo que eu reagiria de forma negativa quanto a isso.

Quando eu conheci seus pais, eu estava nervosa como qualquer garota e eles pareciam mais animados do que o próprio filho com a minha presença ali. Eu tinha uma perspectiva completamente diferente, para mim eu seria a “estrangeira que não tem onde cair morta querendo dar o golpe”, mas eu fui a “garota encantadora que tentava se adequar o máximo possível aos costumes coreanos sem perder as origens de seu país”.

Era o dia do aniversário de . Fomos a um parque onde havia uma pista de patinação. Eu nunca havia patinado no gelo e os típicos patins de rodinhas haviam ficado no Brasil, guardados dentro de uma caixa rosa. pediu para que eu me sentasse em um dos bancos próximos da pista e saiu em busca dos nossos patins. Alguém chegou atrás de mim e eu achei que era rápido demais para que houvesse voltado, eu não precisei virar — eu nem ao menos conseguiria tentar — de repente tudo estava escuro.

.X.

Uma hora. Duas horas... Eu não sei exatamente quanto tempo passou (o tempo costuma parecer andar mais devagar quando estamos ansiosos). A maçaneta girou e a porta rangeu um pouco ao abrir lentamente, era como em um filme de suspense em que você nunca sabe o que irá acontecer. Eu me encolhi na cama, abraçando minhas pernas. Estava em dúvida se olhava ou não. “Seja forte” eu pensei e encarei a porta no exato momento em que um homem entrou.

Jovem. Bonito. Cabelos castanhos. Físico bem definido que estava exposto pela camiseta preta que estava usando. Nas mãos ele tinha uma bandeja com uma jarra de um líquido branco que eu juguei ser água, um copo transparente e uma maçã.

O homem caminhou até a cômoda e deixou a bandeja ali. Eu não parecia tão ameaçadora para ele, uma vez que não se preocupou em fechar a porta. Me encolhi mais quando ele andou pelo pequeno espaço e se sentou na cama, ficando de frente para mim. Ficou me observando por um curto tempo, mas era o suficiente para o nervosismo tomar conta de mim. Eu não falei nada (estava assustada demais para conseguir pronunciar qualquer palavra) e ele tampouco. O garoto se levantou da cama e caminhou em direção à porta. Eu me movi na cama e ela ringiu, mas ele não parecia preocupado, era como se eu não fosse capaz de causar grandes problemas.

— Quem é você? — A minha voz saiu rouca, mas eu tinha esperanças que ele fosse capaz de entender. Talvez não fosse a melhor pergunta a se fazer e talvez eu nem quisesse ouvir a resposta, mas ele somente me ignorou e saiu do quarto trancando a porta novamente.

 


 

CAPÍTULO 2

 

Peguei a maçã da bandeja em uma mão e a analisei. Eu não gostava muito de maçãs e preferia as verdes, mas não parecia haver muitas escolhas. Bobagem ou não, mas era de se esperar esse tipo de coisa, a história da Branca de Neve sendo envenenada por uma maçã passou pela minha mente me fazendo suspirar. Neste caso, a bruxa era o príncipe...

Balancei a cabeça como se aquilo fosse tirar aquela ideia boba de minha mente e abaixei o corpo contra a jarra transparente. Analisei o liquido com cuidado e cheirei, parecia água... Despejei um pouco no copo e tomei de uma só vez. Se algo estava errado, então eu deveria esperar pelas consequências e talvez uma maçã não fosse piorar as coisas quando isso acontecesse.

.X.

Os raios de sol que iluminavam o quarto foram sumindo aos poucos. Me movi na cama, sentindo as pernas dormente e estiquei meu corpo em uma tentativa para relaxar os músculos cansados por tão pouco movimento. Corri até a cômoda que estava abaixo da janela (não que eu precisasse realmente correr, não havia muito espaço para isso) e coloquei a bandeja com a jarra vazia mais para o lado para que eu tivesse um espaço maior para subir. Mesmo ficando na ponta dos pés eu não tinha um campo de visão muito bom, mas percebi que havia muitas árvores. Se eu pulasse, aquela cômoda iria quebrar? Não pensei muito na resposta e apenas pulei, parando na ponta dos pés para “suavizar” o impacto. Um muro ao longe. Foi tudo o que eu consegui ver. É claro que quem quer que fosse não me deixaria tão à vontade assim a ponto de conseguir pedir algum tipo de ajuda.

A maçaneta girou e eu virei o rosto. Havia ficado desesperada demais. E se ele visse que eu estava tentando sair dali? As coisas poderiam ficar piores? Para ser sincera, eu não achava que as coisas já haviam começado a piorar. Pulei da cômoda e torci o pé quando caí no chão. Uma dor surda, uma vontade de gritar e chorar. Uma lágrima caiu do meu olho e eu não ousei me mover um centímetro sequer.

O homem entrou e parou com as costas contra a porta que havia fechado novamente. Eu não olhei o seu rosto, mas sabia que estava me observando. Seus passos vieram contra mim e suas mãos passaram por toda a volta do meu corpo e ao contrário do que eu esperava não era um toque bruto, era calmo e leve como se estivesse preocupado.

Não precisei de muito tempo para perceber que estava novamente na cama. Ele pegou o meu pé e o puxou de forma leve para que eu esticasse a perna. Aos poucos ele começou a massagear o local da torção e eu não sabia se me apavorava mais ou ficava agradecida.

Não sei quanto tempo durou, mas não foi muito. Ele se levantou da cama e caminhou até a cômoda, onde pegou a bandeja. Agora com certeza eu era um perigo insignificante. Quando chegou à porta ele se virou e pela primeira vez eu o ouvira falar.

— Não tente fugir. Só vai se machucar em vão.

O homem saiu e fechou a porta com a mão livre. A chave foi girada e eu apenas refleti suas palavras e embora devesse me causar medo, a sua voz saiu tão firme e natural que eu senti que estava protegida.

 


 

CAPÍTULO 3

 

Eu já havia perdido a noção de tempo, não sabia há quantos dias estava ali. O meu tempo livre me permitiu decorar cada detalhe da cômoda, parede, teto, chão, porta e cama daquele quarto, já que eram as únicas coisas que eu via a maior parte do tempo.

No meu relógio imaginário eu conseguia imaginar exatamente as horas em que o homem entraria e colocaria a bandeja com comida e água no mesmo lugar de sempre e depois em passos calmos ele se viraria e saíra, me deixando sozinha novamente.

Acho que a esse ponto eu já havia sido capaz de decorar também cada traço de seu rosto, o movimento pesado dos fios de cabelo e o modo como ele caminhava, não que fosse diferente ou estranho, eu apenas não tinha muito que fazer.

O sol já ia se pondo e não demorou muito para a porta abrir. O homem parou no arco e deixou a porta aberta. Hora do banho. Levantei da cama e peguei a toalha branca que ele tinha em mãos, depois fui guiada até o banheiro. Havia um pequeno corredor e uma sala onde uma velha TV, uma mesa de centro e um sofá eram tudo o que se via e então o banheiro no outro canto. Eu sempre tive a curiosidade de saber o que havia além do corredor, mas eu não tinha o direito de perguntar, como já era de se esperar.

Atravessei a sala em silêncio e fechei a porta do banheiro atrás de mim. O cômodo era tão pequeno quanto o quarto, o que não me dava muitos movimentos. A toalha foi depositada ao lado da pia e eu comecei a me despir sem pressa antes de aproveitar os longos minutos em que a água quente batia contra a minha pele relaxando cada músculo tenso de meu corpo.

Uma batida na porta foi escutada e eu desliguei o chuveiro, deixando que algumas gotas de água deslizassem sem pudor por todo o meu corpo. A toalha branca veio para uma de minhas mãos fazendo com que eu me enrolasse nela de forma que pudesse cobrir a maior parte de pele possível. Hesitei antes de abrir a porta e me coloquei atrás desta enquanto meu rosto se erguia um pouco para olhar o único homem que eu via há dias.

Ele tinha uma muda de roupas em uma das mãos. Me entregou sem ao menos tentar me olhar ou atravessar qualquer linha que poderia existir entre nós. Eu me senti aliviada. Eu não conseguiria me defender muito bem caso ele tentasse algo, mas eu estava feliz por isso não estar acontecendo.

.X.

Um barulho veio da porta e eu me mexi na cama, perdendo completamente o sono. A madeira fez um leve som ao ser aberta e eu me sentei, fazendo o móvel ringir. O homem que me fazia companhia nos últimos dias entrou, me fazendo ficar dividida entre o medo e a curiosidade. Por quanto tempo ele me manteria ali? Eu não tinha valor algum.

— Deveria estar dormindo. — Sua voz firme e máscula me pegou desprevenida, ele não costuma falar.

— Eu iria fazer isso... — A minha voz falhou um pouco, eu não estava preparada para enfrentar o olhar que ele me lançou ao se sentar aos pés da cama, fazendo o colchão afundar um pouco naquele espaço.

— Como você se chama? — Ele perguntou de forma calma, como se aquilo fosse a pergunta mais normal do mundo. Ele havia me sequestrado sem nenhum motivo? Afinal, ele nem ao menos sabia o meu nome.

... — Disse em tom baixo. A princípio eu tinha dúvidas entre mentir ou ser sincera, mas por fim optei pela segunda alternativa.

— Eu sou . — Ele se apresentou, me fazendo ficar ainda mais confusa.

— Por que estou aqui? — Perguntei, reunindo toda a minha coragem.

— De fato... Deve estar sendo confuso para você, mas eu tenho contas a acertar com alguém e você é a melhor arma para que eu possa atingi-lo.

Do que ele estava falando? Eu nem ao menos tinha família ou grandes amigos naquele país e ele não seria ignorante o suficiente para me confundir com uma nativa coreana.

— A família me causou grandes transtornos há algum tempo... A meu pai e toda a minha família. Eu esperei por bastante tempo, mas acho que encontrei a forma ideal para dar início ao que eu tanto esperei, não é? — Ele continuou ao ver que eu havia me calado. O ar me faltou. Ele estava falando de ...?

— Acha que ele está procurando por você, ? — perguntou ao ver minha expressão de horror. Ouvi-lo pronunciar meu nome só me fez ficar ainda mais amedrontada. — Eu acho que sim, mas ele não vai demorar a saber onde você está. Ele precisa saber para vir até você, não acha? — O moreno dizia em pausas esperando que eu falasse algo, mas a minha voz simplesmente havia sumido. — Não farei nenhum mal a você, ... É ele a quem eu vou fazer mal.

As últimas palavras pareciam ter esmagado o meu coração. Como ele poderia fazer isso? E usar a mim? Eu me sentia horrível, não podia fazer nada... Eu não queria ser um motivo para que algo atingisse , eu o amava.

— Descanse, ... — Ele disse as palavras enquanto se levantava da cama e virava em direção à porta.

Minha mente não pensou direito. Nos segundos seguintes eu estava sobre meus pés e avançava contra que foi pego de costas. Minhas mãos atingiram seu peito quando ele se virou, mas logo elas estavam sendo fortemente contidas. Meus pés trabalharam em vão, enquanto ele se movia habilidosamente pelo pequeno espaço. Eu gritei alguns insultos e xingamentos e sentia a raiva ferver em meu sangue. Não demorou muito tempo para que eu fosse completamente contida. A respiração dele estava bem próxima do meu rosto e seu corpo pressionava o meu, fazendo minhas costas se firmarem contra a parede. Virei o rosto e vi a porta ao meu lado, tão perto, mas tão impossível... levou os lábios até minha audição e eu estremeci quando senti o hálito dele tocar minha pele. Eu tinha vontade de chutá-lo e desprender minhas mãos para que pudesse socá-lo novamente, mas eu sabia que não teria sucesso em nenhuma tentativa.

— Eu disse que não faria mal a você, então não me force a te machucar. — Suas palavras saíram duras, sem nenhuma emoção. Ele girou o corpo e me puxou pelo braço, fazendo com que eu fosse lançada contra a cama de maneira bruta.

Eu estava com medo, seria uma tola se não estivesse...

 


 

CAPÍTULO 4

 

A minha barriga estava protestando com a fome que estava sentindo. havia ficado tão bravo com a minha reação na noite anterior que resolvera me matar de fome e sede? Eu não sabia que horas eram, mas eu só poderia esperar.

O sono me atingiu novamente em algum momento em que eu não consigo me lembrar, mas os meus olhos abriram quando o ringir da porta invadiu o pequeno cômodo onde eu estava confinada há dias.

O moreno entrou e caminhou como de costume até a cômoda abaixo da pequena fresta que me dava ar e pouca luz solar durante o dia, e depositou a bandeja que hoje estava mais cheia. Eu me sentei e o observei, ele ainda estava de costas para mim e mexia em algo que eu não consegui ver o que era.

— Coma isso, você vai precisar. — A voz dele me fez tremer. Eu ainda estava com medo.

atravessou o pequeno quarto e saiu, me fazendo hesitar antes de ir até a comida e começar a devorá-la sem nenhuma ética. Eu estava com tanta fome que esse detalhe era o menos importante naquele momento.

.X.

A água que caía sobre mim e fazia meus músculos tensos relaxarem parou assim que eu fechei o registro. Um suspiro pesado saiu dos meus lábios antes que eu começasse a me secar e me cobrisse com o roupão que me fora cedido naquele dia.

Eu estava apreensiva, não havia reagido de uma maneira muito amigável no dia anterior e tinha medo de que o meu sequestrador começasse a perder a paciência comigo para apenas me tratar da forma como toda refém deveria ser tratada, mas eu também estava preocupada, estava lá fora em algum lugar e onde quer que fosse ele estava correndo perigo.

Atravessei a sala e estranhei que tivesse me permitido fazer o trajeto sozinha, mas ele estava no quarto como se para garantir que eu chegaria lá. Meus olhos miraram o chão e eu entrei sem fechar a porta (seria mais fácil correr se precisasse).

— Você tem quarenta minutos para se trocar. — Ele disse levantando-se da cama e passando por mim. A porta foi fechada e só alguns segundos depois eu consegui raciocinar o que havia escutado.

A cama estava coberta com dois vestidos diferentes, um deles era preto e colado ao corpo, o tomara que caia com um contorno parecido ao de um coração deixava um ombro a mostra enquanto o outro era coberto por um tecido preto transparente que cobria parte do vestido de forma discreta. Já o outro contrastava com o anterior, era branco com um ‘v’ formado nas costas que terminava na altura da cintura, os detalhes em um prata discreto eram distribuídos pelo colo de uma forma milimetricamente estudada.

No chão havia dois pares de sapatos, um scarpin preto discreto e uma sandália prata com fios pequenos que envolviam o salto. Já sobre a cômoda uma maleta aberta deixava à mostra a quantidade de cremes, maquiagens e produtos para o cabelo da qual eu precisaria para me arrumar.

Eu estava assustada. Por que ele seria tão gentil comigo depois do que acontecera e me revelara? Não precisou de mais do que um segundo para que minhas pernas começassem a tremer e as mais absurdas coisas começaram a passar por minha mente. ... Eu precisava protegê-lo e talvez me comportando bem fosse a única maneira.

Respirei fundo e me sentei na cama, estudando os dois vestidos com atenção. Preto, eu decidi ao final e logo me troquei, não queria me atrasar para o que quer que fosse e ainda por cima causar mais raiva ainda no meu sequestrador. Quando comecei a preparar a pele para me maquiar, algumas lágrimas caíram e me fizeram suspirar, fechar os olhos e tentar me acalmar para então começar outra vez. Era uma tarefa tão difícil...

Quando a porta do quarto foi aberta eu já estava sentada na cama como quem espera a hora certa. usava roupas elegantes e sociais, o que só me causava ainda mais curiosidade. Ele estendeu a mão para a saída e eu hesitei antes de me levantar e caminhar até a porta, contudo quando tentei avançar ele me pegou pelo braço, me fazendo parar.

— Vire-se. — A voz dele saiu dura, seca.

Fiz o que ele mandou e logo meus olhos foram cobertos por uma venda, eu me xinguei mentalmente, era tão óbvio que eu não saberia o caminho de saída...

me guiou de forma firme e eu senti o barulho de grade se abrindo. O corredor... Antes da porta havia uma grade como que para se certificar que eu estaria ainda mais segura. Eu andei um pouco mais e o ar parecia mais limpo, não como o oxigênio abafado do outro cômodo, mas eu sentia que ainda não estava na rua. Eu levantei a perna quando me foi alertado e subi um degrau, em seguida o som de porta se abrindo fez com que eu ficasse tensa. Eu poderia fugir? Não... correria perigo se eu o fizesse... E se eu ficasse? Ele ficaria bem se eu seguisse as regras? Eu queria chorar, era tão difícil...

Um novo som foi facilmente reconhecido. A porta de um carro. me abaixou e me fez entrar, mas eu ainda não tinha a permissão de tirar a venda que cobria meus olhos. Só depois de longos minutos rodando no automóvel ele parou e arrancou a tira de meus olhos. Eu pisquei, tentando me acostumar novamente com qualquer coisa que não fosse o escuro e engoli em seco.

Aonde iríamos? Eu encontraria aquela noite? Meu coração saltou, eu estava tão confusa, eram tantos sentimentos diferentes...

O carro parou depois de mais ou menos meia hora e o moreno estacionou em uma vaga reservada. Eu olhei em volta e percebi que o local era mais movimentado do que eu espera... Provavelmente para tentar não chamar a atenção, eu pensei.

desligou o carro e tirou o cinto, podendo se mover mais livremente no banco antes de se virar para mim e me olhar como um pai que explica as regras para um filho antes de sair de casa.

— Se tentar qualquer coisa, então a situação vai piorar muito. — Ele disse em um tom baixo, mas o suficiente para que eu escutasse. É claro que ele não estava falando de mim e sim de .

Eu assenti com a cabeça e torci os lábios, umedecendo-os. Minha boca estava seca. Eu não fazia ideia do que me esperava lá dentro...

 


 

CAPÍTULO 5

 

O que exatamente estava acontecendo eu não sabia, mas realmente era uma das coisas que eu não esperava. “Calma, ele vai aparecer a qualquer instante”, eu pensava. Era tão óbvio que estaria ali e que iria me ver, era tão clichê...

O salão estava repleto de pessoas, todas bem vestidas e de comportamentos impecáveis. Eu estava me sentindo perdida. colocou uma mão sobre minhas costas e me guiou para o canto da sala, fazendo questão de pegar dois drinques e me entregar um.

— O que é isso? — Eu sussurrei a pergunta de forma hesitante. Ele havia me dado o direito de perguntar?

— O que isso parece? — Ele respondeu, bebericando a bebida.

— Não faz sentindo... — Eu comecei e fiz uma pausa. — estará aqui? — Eu tentei não demonstrar emoções, mas era impossível.

me olhou e fez menção de falar algo, mas alguém se aproximou de nós. Um homem baixo e rechonchudo. Os cabelos negros dividiam espaço com fios grisalhos e o rosto redondo era coberto por um bigode.

! — Ele cumprimentou meu sequestrador, que retribuiu de forma simpática. — Eu imaginei que você não faltaria, mas... — O homem desviou o olhar para mim e eu fiquei petrificada. — Quem é essa?

me olhou como se estivesse hesitante, mas as ordens dele eram claras e eu não sabia quem aquele homem era. Eu não faria nada que pudesse prejudicar , então apenas sorri de forma leve, mas meu sorriso vacilou quando meu sequestrador voltou a falar.

— Minha noiva.

Eu ainda estava tentando raciocinar direito o que ele havia dito, mas eu não tinha tempo. O homem rechonchudo voltou sua atenção para mim e estendeu a mão direita.

— É um prazer conhecê-la, senhorita. Eu sou Hwang Benjamin. Nascido nos EUA, mas de volta ao meu país. — Ele disse mais do que o necessário e eu apertei sua mão.

— Eu sou . . — Disse de forma simples. Não queria prolongar a conversa. Estava com medo de falar algo que reprovasse.

— É americana? — Benjamin continuou e eu o xinguei mentalmente.

— Brasileira. — Eu sorri fraco novamente. Esperava que ele percebesse o quão animada para conversar eu estava.

— Você foi longe! — O homem disse com a voz animada, agora se voltando para , que sorriu com o canto dos lábios antes de passar um braço em volta de minha cintura.

— Não me arrependo. — Ele respondeu, o rosto se virando alguns centímetros para me olhar de perfil.

— Eu não me arrependeria se estivesse em seu lugar! — Benjamin disse, deixando um sorriso malicioso aparecer aos poucos nos lábios. Eu fiquei completamente incomodada, principalmente quando ele me analisou dos pés à cabeça.

— Com todo respeito, Delegado. Ela é a minha noiva. — Por algum motivo, deu ênfase à palavra ‘minha’ e neste momento ele me apertou mais contra ele. O mais velho sorriu amarelo e acenou com a cabeça antes de resmungar um “claro, claro” em voz baixa e então logo se despediu e se afastou de nós.

— Delegado? — Eu sussurrei para o moreno quando ele me soltou.

— Suponho que algumas ideias estão passando por sua cabeça agora.

Por uma fração de segundos eu me senti mais segura, mas o olhar que o homem havia lançado para mim fez com que todo aquele sentimento sumisse, na verdade, naquele momento eu agradeci por estar ao lado de .

— Não farei nada que o prejudique. — Sem nomes, mas ele sabia de quem eu estava falando.

— Ele merece tudo isso?

— Sim. Eu o amo.

— Não importa o quanto tente. Não há nada que você possa fazer.

Aquelas palavras foram como facas afiadas sendo lançadas contra meu peito. Eu estava ali e era o motivo principal para que corresse perigo, no entanto eu era apenas o problema... Eu não poderia fazer nada para ajudar... Era completamente injusto e doloroso.

— Isso não precisa ser assim, você... — Não terminei. se aproximou de mim de forma tão rápida e sua respiração ficou tão próxima que eu tive que levantar os olhos para olhá-lo diretamente.

“Shhi”, ele produziu o som com os lábios e as pontas dos dedos deslizaram por meu ombro despido. — Já chega.

A voz dele era dura, me causando um tremor de medo. Há alguns dias eu parecia estar tomando mais liberdades de dizer o que realmente sentia e aquilo só estava piorando as coisas, eu deveria morder minha própria língua para não atrapalhar mais.

se afastou e pegou minha mão. Em passos apressados, mas discretos para que não pudesse chamar a atenção, ele me guiou até a porta e depois ao estacionamento, me fazendo entrar no carro sem enrolação. A venda veio novamente para meus olhos e ele próprio colocou o cinto para mim. Eu estava tensa, não queria me mover e receber os toques dele naquele ato.

Ele se afastou e segundos depois eu ouvi o som do motor. Movimentos leves indicavam que estávamos saindo daquele lugar. Eu só não sabia para onde seria levada...

.X.

Com os olhos vendados, me obrigou a subir algumas escadas que eu não fiz questão de contar os degraus. Ele me jogou para dentro de algum lugar e eu ouvi a porta ser trancada. Silêncio. Eu permaneci algum tempo sem me mover e aos poucos levei as mãos ao rosto, retirando o pano que cobria meus olhos.

O quarto era diferente. A janela estava aberta e parecia ser no segundo andar, o que só se confirmava pelo fato de ter subido a escada. A cama era de casal e os lençóis tinha um tom de rosa envelhecido. Era um lugar completamente diferente do que eu estava antes. Era bem cuidado e tudo parecia ter custado muito caro. A decoração, os móveis, as paredes, teto... tudo.

Eu me virei para analisar a porta e me surpreendi. Eu não estava sozinha. estava ali e me observava. Abaixei os olhos, envergonhada por meus pensamentos tolos e engoli em seco.

Ele se aproximou em poucos passos e segurou meus braços de forma firme, mas não o suficiente para me machucar. Sem demora, ele me guiou até a parede e me prendeu lá, forçando-me a olhar em seus olhos.

— Qual parte de tudo você ainda não entendeu? — A voz dele era dura.

Eu abaixei o olhar, não havia nada que eu pudesse responder.

— O que você queria lá? Chamar a atenção? Ver tudo ir por água abaixo? Matar ? — Aquelas palavras foram um soco no meu estômago.

— Eu... — Comecei, mas algumas lágrimas rolaram de meus olhos e por algum motivo o aperto em meu braço se afrouxou. Ele levou um dedo ao meu queixo e me fez olhar novamente para ele. Eu sussurrei um “desculpa” antes que o nó na minha garganta apertasse mais.

me olhou por longos segundos e eu desviei o olhar, era ainda mais doloroso saber que estava fazendo tudo errado. Que estava colocando em mais perigo. Eu só... Meus pensamentos foram interrompidos quando os lábios do moreno encontraram os meus. Eu estava surpresa. Eu deveria me afastar, mas ele passou a movê-los sobre os meus de maneira calma e quando percebi meus olhos já haviam se fechado e eu estava retribuindo.

Reunindo o último fio de raciocínio, eu coloquei a palma da mão sobre seu peitoral e afastei meus lábios. Ele me olhou com calma e os dedos em meu queixo foram para uma de minhas bochechas, tocando-me com leveza.

— Por favor. — Ele pediu em um sussurro e aproximou novamente os lábios dos meus. Dessa vez eu não o parei e não era apenas porque não queria piorar as coisas para . Eu queria aquilo...

 


 

CAPÍTULO 6

 

A visão escura acabou no exato momento em que abri os olhos, meu corpo se moveu por instinto e eu senti o colchão macio abaixo de mim e os lençóis cobrindo minha pele com delicadeza. Ergui a mão até meu rosto e o esfreguei uma vez, ainda precisava colocar os pensamentos em ordem. 

 

[Flashback on] 

pressionou mais o corpo contra o meu e um suspiro fraco escapou por entre o beijo que parecia ter se tornado mais urgente. Não sei desde quando e com certeza eu estava surpresa, mas eu queria tanto aquele beijo quanto ele também parecia querer. Ele mordiscou meu lábio inferior e o puxou, soltando-o por entre os dentes aos poucos. Eu sorri. Sorri da maneira que pude e meus braços envolveram o pescoço dele. Eu estava contra a parede e o moreno se aproveitou disso para me colocar em seu colo, deixando minhas costas firmes contra o concreto gelado. Um arrepio percorreu meu corpo e eu me xinguei mentalmente. Meus olhos estavam fechados e continuaram assim logo que senti os lábios dele deslizarem para meu pescoço, mordiscando e deixando beijos molhados por toda minha pele.

— Tão doce... — Ele sussurrou e então puxou o ar pelo nariz, podendo sentir meu perfume. Automaticamente minhas mãos agarraram alguns fios de cabelo que estavam em sua nuca, puxando-os sem nenhuma força. Ele sorriu. Ele havia gostado. 

ergueu o rosto novamente e seus lábios encontraram os meus, com tanta urgência que eu achei que o ar iria me faltar. Era tão errado... Mas também era tão bom. 

Não. Definitivamente não.  

Reunindo toda força que me foi possível eu desfiz o abraço em volta de seu pescoço e apoiei minhas mãos em seus ombros, forçando-o a se afastar e naquele momento ele soltou o meu corpo, fazendo com que eu ficasse sobre meus pés novamente.  

me olhou, ele estava confuso, mas não arriscou perguntar. Contudo, eu achei que devia uma resposta a ele, eu não queria que ele entendesse tudo errado, eu estava fraca, foi uma fraqueza, uma maldita fraqueza. Eu jamais faria aquilo, não em uma sã consciência.  

— Não. Eu não posso. 

— Faça-me acreditar. — Ele me desafiou, a voz rouca pelo seu tom baixo. 

— Eu não quero. — Ao dizer isso, se afastou e então virou de costas. Eu respirei fundo, mas não ousei sair do lugar. Ele estava com raiva? O que estava acontecendo? Eu havia feito algo errado novamente? Certamente eu não fiz as perguntas e tampouco recebi as respostas. Nos segundos seguintes, ele estava batendo a porta e eu ouvi a chave ser girada pelo lado de fora. 

[Flashback Off] 

 

Idiota. Eu me xinguei. Era cedo para já estar com raiva de mim mesma, mas eu estava. Ultimamente isso era comum e eu tampouco me importava. Sentei na cama e olhei para o lençol macio, eu estava tão confusa... 

— Ele acha que eu o beijei porque achava que seria uma forma de dizer “Por favor, não faça nada com ”? — Sim. Eu estava falando alto e sozinha. Não. Eu não estava maluca, mas isso fazia com que os pensamentos fossem mais claros para mim. 

— Por que eu o beijei? — Continuei. Eu não tinha a resposta. — Aish~ Eu me sinto tão culpada. Eu amo o ... Eu amo. – A última parte da frase saiu de forma firme como se eu quisesse me convencer daquilo, mas eu não tive tempo pra isso já que a porta foi aberta. 

— Com quem estava falando? — perguntou enquanto olhava para os lados a procura de qualquer pessoa. 

— Com ninguém. — Disse de forma simples. 

— Não sabia que falava sozinha. — Ele estreitou os olhos e então deixou a bandeja que tinha nas mãos em cima de uma cômoda ao lado da porta. 

— Você não sabe nada sobre mim.

me olhou, ou melhor, me fuzilou com o olhar. Era realmente assustador, mas eu permaneci firme. Firme até que suas palavras me atingissem como se pedras fossem arremessadas contra mim.

— Não me interessa saber algo sobre você. 

Eu realmente não sabia a razão, mas parecia que um buraco havia sido aberto dentro de mim. Ele não se importava... Mas por que isso me afetava tanto? se importa e isso é o que vale... Não é? Por Deus! Eu não podia estar sendo atraída por aquele bandido! 

.X. 

Embora em um quarto mais confortável, meu dia se resumia em olhar pela janela enquanto permanecia sentada em uma confortável poltrona que eu tive que arrastar por todo o quarto. A noite já havia chegado e como ironia do destino a lua estava tão linda e acompanhada por tantas estrelas que eu poderia até esquecer o que fazia ali, naquele lugar. 

— Deve ser cansativo. — A voz de veio de trás de mim, mas eu não me assustei. Eu já estava acostumada àquela voz. 

— Ficar o dia todo trancada em um quarto? Sim, é. — Eu respondi sem ao menos desviar o olhar do céu. 

— Eu sinto muito. — Ele falou e eu senti o barulho leve da cama quando ele se sentou. Sabia que seus olhos estavam em mim, mas isso era o menor dos problemas agora. 

— Não estrague isso! — Troquei o assunto. Ele provavelmente começaria a dizer o quanto sentia muito por eu ter sido o motivo principal pra fazer sofrer. 

— Isso? — estava confuso e eu não precisei olhá-lo para saber que provavelmente tinha uma sobrancelha erguida, indicando seu desentendimento. 

— A noite.  

— O que tem a noite?  

— Eu gosto da noite. — Dessa vez eu o olhei e ele desviou o olhar para o lado de fora da janela e depois até encontrar os meus olhos novamente. 

— Por que gosta da noite? — inclinou o corpo para frente e as mãos seguraram em volta da poltrona, virando-a comigo acima (como se fosse um peso totalmente insignificante) e fazendo com que eu ficasse de frente para ele. 

— Achei que não se interessava em saber algo sobre mim. — Eu sustentei o olhar dele, deixando clara a ironia das palavras. 

respirou fundo uma vez como se lutasse interiormente para não me dar uma má resposta e por fim respondeu.

— Responda,

Eu não falei nada por um momento. Ele havia dito o meu nome e isso era completamente raro, mas escutando-o daquela forma eu senti uma vontade imensa de poder ouvir mais vezes. Idiota. Eu me xinguei. O que eu estava pensando? 

— Hm... Eu gosto da noite porque é tranquila. É silenciosa. Você não se sente assim? Como se estivesse sozinho, mas ao mesmo tempo pensando em tantas coisas boas que já aconteceram e pensando sobre o que pode acontecer daqui pra frente? 

Ele não respondeu e eu fiquei em dúvida se aquilo era um sim ou um não, contudo ao menos tive tempo para tentar pensar nas possibilidades e ele tombou o corpo para apoiar os cotovelos nas pernas, próximo aos joelhos. 

— Sabe há quanto tempo está aqui? — Perguntou e eu resolvi pensar sobre aquilo. Eu não fazia ideia. 

— Não. — Confirmei minha resposta com um aceno negativo da cabeça. 

— Três meses. 

Eu fiquei surpresa. Já havia se passado três meses? Era completamente inacreditável.

— Três? 

— Sim, mas isso logo vai acabar. 

— O que você vai fazer? — Perguntei em um impulso. 

— Você sabe o que eu vou fazer.

— Por favor... — Comecei, mas ele me interrompeu. 

— Não venha me pedir isso. Eu já tomei uma decisão então não torne as coisas mais difíceis. Você sabe como é perder alguém importante? Aposto que não. 

— Não. Eu não sei. — Disse e então fiz uma pausa, criando coragem para dizer o que sentia naquele momento. Respirei fundo e o encarei, tentando demonstrar o quão seriamente eu estava falando. — Mas você está perto de me mostrar como é isso. 

não se moveu, ele havia entendido. Ele sofria pela perda do pai, mas ele também seria o responsável por causar a mesma dor em mim. Provavelmente aquelas palavras tiveram algum efeito sobre ele e eu rezava para que fosse o de arrependimento. 

— Eu sinto muito.  

— Não precisa fazer isso. — Minha voz saiu baixa, calma. Eu inclinei o corpo pra frente e estendi uma mão até que ela tocasse o rosto de e então ele me olhou com um leve sorriso no rosto, um sorriso que me fez ver o quão bonito ele era, o quanto ele sofria e só por isso havia se tornado a pessoa fria que me mostrara nos últimos três meses.  

— Você não entende... Ele tirou o meu pai e eu vou tirar o filho dele. É a única maneira. — Dessa vez ele falou com um tom de quem se desculpa e minha mão caiu de seu rosto, voltando para meu colo. — É completamente idiota e egoísta dizer isso, mas eu não queria te machucar. Desculpe, mas é a única maneira. 

— Sempre há outra saída! — Por mais que tentasse manter minha voz calma, eu estava desesperada. 

— Não, . Eu já fiz a minha escolha. — se levantou e abaixou um pouco o rosto para deixar um beijo calmo em minha testa. Eu fechei os olhos e inspirei o perfume masculino. As lágrimas começavam a querer cair, deixando um nó em minha garganta. — Eu sinto muito.  

Foram as últimas palavras que eu ouvi naquela noite. Depois eu só me ocupei em olhar a lua, pensar, chorar... Eu não queria que fosse daquele jeito e eu estava tão dividida... Eu perderia , a pessoa que fora tão importante na minha vida. Mas eu também perderia , porque era inevitável. Resumindo, eu perderia tudo. Céu e terra. Lua e sol. Eu estava sozinha agora... 

 


 

CAPÍTULO 07

O motor do carro parou e a venda foi tirada de meu olho. Olhei pelo vidro escurecido do carro e me deparei com uma cena comum. Não era algo que eu imaginava: um deserto ou estrada sossegada. Mas sim um estacionamento vazio àquela hora da madrugada.

Uma hora atrás, havia entrado no quarto e me sacudido de maneira delicada. “Vamos encontrar ”, foi tudo o que ele me disse antes de me entregar roupas novas e esperar que eu fosse até o banheiro me trocar. Agora estávamos aqui. Alguns poucos carros estavam espalhados e eu observei com calma, tentando achar qualquer vestígio de que Ele realmente estava ali.

Cerca de três minutos depois, um carro subiu pela rampa do prédio e parou no lado oposto ao carro preto em que estávamos. se moveu inquieto ao meu lado e abriu o porta-luvas. Um choque percorreu todo meu corpo quando vi do que se tratava. Um revolver. Um Magnum .44, para ser mais exata, e eu só sabia disso porque adorava programas de notícias.

A porta do carro do outro lado do estacionamento foi aberta e um homem alto e familiar saiu. Meu coração falhou uma batida. . O nome saiu em um sussurro e eu engoli em seco com a surpresa. Agora era aterrorizante vê-lo ali.

Fiz menção de levantar, mas foi mais rápido e me prendeu. Ele me olhou nos olhos e por um segundo pareceu que estava desesperado com aquele momento.

— Não vá. — Sussurrou. Não era uma ordem. Era um pedido.

Fechei os olhos por alguns segundos e deixei que o ar entrasse e saísse de forma pesada dos meus pulmões. — Eu sinto muito.

Agora era eu quem estava falando aquilo e foi o suficiente para saber que não iria mais insistir. Ele tirou o cinto e destravou a porta, saindo primeiro e me deixando sair em seguida.

me olhou preocupado. Eu conhecia aquele olhar, ele queria saber se estava tudo bem. Deu um passo para frente, mas a arma foi apontada para ele, fazendo-o parar. — Venha até aqui. — Exigiu , olhando em minha direção e eu caminhei hesitante. Sabia que ele não me faria mal, mas não era comigo que eu estava preocupada.

— Não a machuque. — falou alto, causando um incômodo no silêncio da manhã.

riu baixo e eu engoli em seco mais uma vez.

— Você realmente não me conhece, . Eu só quero chegar até você. Acha mesma que eu a machucaria?

Se escutou, então não respondeu e apenas voltou sua atenção para mim. — Você está bem, jagiya?

Acenei com a cabeça de forma positiva. Um nó estava formado na minha garganta e eu não poderia falar.

— Você não sabe o quanto ele a procurou, . — disse, chegando mais perto de mim e a mão que segurava a arma relaxou. — Ele realmente a ama.

Aquelas palavras foram o suficiente para fazer as lágrimas caírem de forma desesperada de meus olhos.

— O QUE ESTÁ FAZENDO? — gritou, sem se importar com o perigo nas mãos do homem ao meu lado e avançou.

— Fique onde está! — exigiu e como garantia apontou a arma para mim, fazendo com que ficasse parado de forma quase imóvel. — Diga que o ama, .

Surpresa. Mais uma vez surpresa. Ergui uma mão para secar os olhos e contive um soluço ao olhar nos olhos do homem a minha frente. — Eu te amo tanto... — Aquelas palavras nunca foram tão difíceis de serem ditas.

me olhou. Um olhar e um sorriso. Então nos segundos seguintes um som estrondoso ecoou pelas paredes do estacionamento. Um. Dois. envolveu meu corpo, me segurando, quando um grito escapou de minha garganta. Eu me debati até me soltar e ele não me impediu mais.

Não posso explicar meus sentimentos. Era como se os disparos tivessem perfurado o meu coração. Minhas pernas bambearam ao ver o corpo de cair sobre os joelhos e eu me joguei no chão, aparando-o da maneira que consegui. Eu estava chocada demais pra conseguir falar. Meu mundo estava desabando.

... — Chamei o nome, deitando-o da forma mais delicada que consegui e ele me olhou. Tinha os dentes cerrados como se evitasse um grito de dor e o sangue estava criando uma pequena poça no chão abaixo dele. — , por favor... Não pode me deixar...

— Vem comigo. — A voz de me pegou de surpresa. Ele estava atrás de mim e havia me tocado no ombro.

Olhei para ele com repulsa, nojo e gritei para que saísse de minha frente. Então sem dizer mais nada ele se afastou. O motor do carro ecoou novamente antes que os pneus derrapassem pelo piso e saíssem de forma acelerada do prédio. Agora era e eu, mas ele estava indo embora... E percebi isso quando ele fechou os olhos aos poucos. Eu me desesperei, mas constatei que ainda havia respiração. Tentei pensar coerentemente e peguei o celular em um dos bolsos dele. Eu precisava ser rápida. Eu precisava de ajuda.

 


 

CAPÍTULO 8

 

A claridade entrou pelas janelas de vidro do quarto bem iluminado e revestido de uma coloração clara e tranquilizante, me fazendo ter um movimento brusco que causou uma leve dor no pescoço. Passei a mão no rosto e estreitei os olhos ao levantar o corpo da poltrona do quarto de hospital.

O bip dos aparelhos me confortava, isso queria dizer que o estado considerado grave de ainda poderia ter alguma melhora. Já havia se passado uma semana naquele hospital, mas eu estava firme, estava forte. O pai de queria respostas e eu queria esquecer todas elas e foi isso que fiz, não disse nada. Eu só queria que tudo aquilo acabasse bem.

Dobrei o cobertor que havia usado na noite anterior e então me aproximei da cama no centro do quarto.

– Você dormiu bem, amor? – Eu sabia que estava falando comigo mesma, mas também sentia que ele podia escutar.

A porta se abriu atrás de mim e a Sra. entrou com um sorriso confiante no rosto. Ela havia me acolhido como uma filha, ela sabia que eu sabia de algo, mas foi compreensiva o suficiente para entender e respeitar a minha dor.

— Vá para casa, querida. Você está sempre com ele, precisa descansar. — Ela colocou a mão no meu ombro ao falar e eu me levantei com um fino sorriso no rosto.

, ele a ama. Sempre vai amar. — A Sra. disse quando coloquei a mão na maçaneta da porta para abri-la então me virei e olhei para sobre a cama de hospital.

— Eu também o amo... Sempre vou amar.

.X.

Chegar em casa nos últimos dias sempre parecia uma tarefa completamente exaustiva. Eu não havia perdido minha bolsa de estudo por tantas faltas já que os pais de foram bons o suficiente para intervirem por mim na Universidade, mas eu sabia que não conseguiria me focar em nada naquele momento. Eu queria cogitar a ideia de voltar para casa, mas eu não o deixaria ali, eu estava certa de que iria acordar mais cedo ou mais tarde e eu o esperaria até o último minuto.

Contudo, as coisas não pareciam tão fáceis... Uma parte de mim ainda sentia falta de e eu sabia que deveria odiá-lo, mas o máximo que eu conseguia era ter raiva. Eu não queria entender a dor dele, mas eu entendia antes mesmo de pensar em culpá-lo e era exatamente por isso que eu estava disposta a guardar comigo tudo o que havia acontecido nos três últimos meses.

Uma música calma foi a trilha sonora do meu banho quente e meus cabelos ainda estavam molhados quando me joguei na cama e fechei os olhos como se quisesse esquecer cada segundo daquele dia. Virei o corpo e um barulho de algo amassando me fez tatear o colchão às cegas até encontrar algo que eu julguei ser um papel dobrado. Abri os olhos e analisei a coloração branca que parecia estar vazia, pensando em ignorá-lo por um momento, mas eu era curiosa demais para conseguir, então o abri.

Eu sinto muito

Era o que estava escrito. Uma letra bem trabalhada e pequena que me fez sorrir brevemente ao analisá-la. Fechei novamente os olhos e deixei o papel sobre meu corpo enquanto uma nova música parecida contagiar a casa com uma áurea de sossego, mas, quase como quem acorda aos pulos de um pesadelo, eu abri os olhos e novamente olhei o papel.

Aquela letra não era minha e estava longe de ser... “Eu sinto muito”, as palavras ecoaram no meu ouvido e uma lembrança passou diante de meus olhos.

— Sempre há outra saída!

— Não, . Eu já fiz a minha escolha. Eu sinto muito.

O meu mundo pareceu desabar novamente. Levantei de um salto e corri para o guarda-roupa, onde peguei as peças mais práticas que eu poderia conseguir. As lágrimas estavam enchendo novamente meus olhos quando saí de casa, correndo cada vez mais rápido até o ponto de ônibus mais próximo.

Algumas pessoas olhavam meu nervosismo, afinal era algo impossível de conter. Meus olhos não saíam do relógio como se eu precisasse desarmar uma bomba no centro de Seul, mas não... Eu só queria saber que eu estava errada com as minhas conclusões.

Quando parei o ônibus, eu não preciso dizer que quase saltei dele e comecei a correr até chegar ao pátio do hospital, onde eu congelei. Alguns metros a minha frente um homem familiar vestido em jaleco branco virou o rosto e também parou ao notar minha presença.

Todas as lágrimas que eu havia segurado agora jorravam de meus olhos e eu queria gritar, mas não tinha forças pra isso. Eu corri e não se moveu nenhum passo para evitar que eu entrasse no hospital. Eu não sei o que ele fez depois, mas eu tinha quase certeza que havia ido embora.

Eu não esperaria o elevador, então subi as escadas com um nó na garganta que estava me fazendo engasgar. Era difícil enxergar e era difícil respirar. A porta do quarto de estava aberta quando parei ao chegar ao sétimo andar. Estava petrificada e praticamente me arrastei até o meu destino. Medo. Eu estava com muito medo e um fio de esperança ainda existia, embora ficasse cada vez mais fraco.

Quando me aproximei, minhas pernas bambearam e eu caí no chão, me segurando ao arco da porta que apertei com força.

estava ali, deitado... Os aparelhos não faziam mais som, o pai dele tentava conter uma lágrima enquanto a Sra. se debruçava sobre o corpo do filho...

Ele havia conseguido. finalmente havia conseguido... Ele me mostrou como era perder alguém. Agora eu sabia como era aquela dor... Agora eu sabia como era perder uma parte do coração...

 


 

EPÍLOGO

 

O luto presente parecia deixar meus dias cada vez mais lentos. Tentando correr, tentando acordar, tentando sobreviver e além de tudo isso, tentando viver com a ideia de que nunca mais veria e que mesmo tão errado, algumas vezes ainda me pegava pensando em . Coisas como “e se eu tivesse feito ele mudar de ideia?”, “ poderia estar comigo”, “eu fui tão impotente e por minha culpa eu perdi a pessoa que amava”, ainda passavam por minha cabeça e me faziam lembrar do velório onde no final eu tive que encarar a senhora com os olhos inchados e vermelhos pelo excesso do choro, embora eu soubesse que a estética era a coisa menos importante no momento e eu estava na mesma forma.

“Eu sei que você sabe quem fez isso” ela me disse e ao menos me deixou falar para continuar sua linha de raciocínio. “Não vou pedir que o entregue, mas eu não quero mais vê-la. a amava demais e eu não quero guardar uma lembrança tão viva do meu filho. Eu preciso não ver mais você.”

Sempre achei as palavras educadas e compreensíveis, eu também queria esquecer os fatos e aquele era o melhor momento, a melhor forma. Dois meses era o que me restava e logo eu estaria de volta ao Brasil, não havia motivos para ficar, afinal nem mesmo os três meses desde que havia partido foram suficientes para aliviar um pouco da minha dor e talvez essa fosse uma tarefa que minha família se incumbiria de realizar. Eu precisava de amigos, precisava de um abraço, mas no momento eu só tinha a visão da universidade na minha frente enquanto me escondia em meio às árvores de um parque mais ao longe que me dava uma visão de cima.

O barulho de galhos quebrando e poucas folhas sendo amassadas não chamou minha atenção, eu sabia que algum amigo viria ali me “acordar” de meus pensamentos e me levar para uma sala de aula em que nada fazia sentido. Eu não me virei, mas eu sabia que quem quer que fosse estava ali, ajoelhado atrás de mim, observando a cena da universidade ao longe.

— Eu sei que causei muita dor, mas está doendo sem você. Eu não sei quando começou, mas eu sei que não acabou quando deveria. — A voz grave fez uma lágrima escorrer de meus olhos antes que uma escuridão fosse a única coisa que eu enxergasse e ao longe antes do cheiro forte no pano me tirar a consciência, ainda tive tempo de ouvir a continuação. — Eu não posso te deixar ir...

A caneta caiu de minha mão direita e meu corpo estava entregue, eu sabia que quando acordasse não estaria mais ali, sabia exatamente em qual quarto acordaria e sabia quem seria a pessoa me esperando abrir os olhos: .

Sim, eu estava sendo mais uma vez sequestrada, mas agora eu não tinha o que perder, eu não queria me libertar, eu só queria um lugar e alguém pra me apoiar e ele estava ali. Meu sequestrador e a pessoa que arrancou o meu mundo agora era o único que poderia construir as paredes ao redor novamente. Tão frio e tão quente, tão amargo e tão doce. Era doloroso por ser tão bom e no final eu não havia perdido tudo...

 

~Fim~


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10 comentários:

  1. Desculpaaaa. Eu mandei errado. Pensei que fosse outra pessoa. Me desculpa? Contunua por favor. T-T

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    1. kkk Tá desculpada! q Mais um capítulo postado, o resto é um segredo que logo logo chega!

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  2. :O
    Maldaaaaade parar nessa parte! :(

    Preciso ler a continuçããão T_T

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    1. Atualização feita <3 Obrigada por estar lendo!!

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    2. Ajuda a achar? Naum entendo como acha >…<

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  3. Meninaaaa, que talento que você tem! *-----* Parabéns!
    Sofro demais cada vez que termina um capítulo! hahahaha
    Ansiosa pela atualização <3

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  4. X-x Oh God!

    Vi escreve tão bem que msm em um ônibus barulhento e em movimento a gente consegue entrar na história e esquecendo do o ambiente ao redor.

    Continua please... preciso urgentemente de atualizações nessa e em outras duas que sigo!

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  5. Aigoo, cade o resto? como assim? Pode isso produção? Kkk
    Ai shisus vou ter um treco...

    Sempre entro pra ver se você atualizou, ou seja estou in love por essa fic!
    Por favor atualize logo viu kkk

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  6. Ain ameiii
    Mais eu nao cosigo achar o resto... tem como me ajudar ou mandar link?
    Desculpa por pedir... maiis... ta DIVOSA
    Please >…<

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